601 (64) Em determinada ocasião, uma das nossas irmãs[295] ficou mortalmente doente. Reuniu-se toda a congregação[296] e também estava presente o sacerdote[297], que deu a absolvição à doente. Então vi um grande número de espíritos das trevas. Nesse momento, sem pensar que estava em companhia das irmãs, peguei o aspersório, aspergi-os e logo desapareceram. Quando, porém, as irmãs vieram ao refeitório, a madre superiora[298] chamou-me a atenção, dizendo que eu não devia aspergir a doente na presença do sacerdote, pois essa função competia a ele. Aceitei essa advertência em espírito de humildade; mas, de fato, a água benta traz grande alívio aos moribundos.
602Meu Jesus, Vós vedes como sou fraca por mim mesma, por isso resolvei Vós mesmo todos os meus problemas. Sabei, Jesus, que sem Vós não tomarei qualquer iniciativa, mas Convosco empreenderei as coisas mais difíceis.
603 (65) 29.01.1936. À noite, quando me encontrava na cela, vi de repente uma grande claridade e, no alto dessa claridade, uma grande cruz de cor cinza-escura. Subitamente fui arrebatada para perto dessa cruz, mas, olhando para ela, nada compreendia e rezava para saber o que isso devia significar. Nesse momento, vi o Senhor, e perdi de vista a cruz. Jesus estava sentado numa grande claridade, os pés e as pernas estavam submersos nessa claridade até os joelhos, e de tal maneira que não os via. Jesus inclinou-Se em minha direção, olhou bondosamente para mim e falou sobre a vontade do Pai Celestial. Dizia-me que a alma mais perfeita e santa é aquela que cumpre a vontade do Pai, mas não são muitas as almas assim. Deus olha com amor especial para a alma que vive fazendo a Sua vontade, e Jesus me disse que eu estou cumprindo a vontade de Deus de maneira perfeita, ou seja, perfeitamente, e — por isso uno-Me contigo e convivo contigo de maneira tão especial e íntima. Deus envolve de amor inconcebível a alma que (66) vive segundo a Sua vontade. Compreendi quanto Deus nos ama, como Ele é simples, embora inconcebível, como é fácil conviver com Ele, embora seja tão grande a Sua majestade. Com ninguém tenho tanta facilidade e liberdade como com Ele; nem mesmo uma mãe com o seu filho, extremosamente amado, se entendem tão bem como a minha alma com Deus. Quando estava nessa união com o Senhor, vi duas pessoas e seu interior não me era oculto; é triste o estado dessas almas, mas confio que também elas glorificarão a misericórdia de Deus.
604Também nesse mesmo momento vi certa pessoa[299] e, em parte, o estado da sua alma e as grandes provações que Deus envia a essa alma. Esses sofrimentos relacionavam-se com a sua mente, e de forma tão aguda que fiquei com pena e disse ao Senhor: “Por que procedeis assim com ele?”. E respondeu-me o Senhor: Pela sua tríplice coroa — e o Senhor também me deu a conhecer que inconcebível glória aguarda a alma que aqui na terra é semelhante (67) a Jesus sofredor; tal alma será semelhante a Jesus também na glória. O Pai Celestial admira e reconhece as nossas almas na medida em que vê em nós a semelhança com Seu Filho. Compreendi que essa semelhança com Jesus nos é dada aqui na terra. Vejo almas puras e inocentes sobre as quais Deus exerce a Sua justiça, e essas almas são vítimas que sustentam o mundo e completam aquilo que falta na Paixão de Jesus; essas almas não são muitas. Alegro-me imensamente por Deus me ter permitido conhecer tais almas.
605Ó Santíssima Trindade, Deus eterno, agradeço-Vos por me terdes dado conhecer a grandeza e os diferentes graus de glória em que se dividem as almas. Oh, que grande diferença existe entre um [e outro] grau dentro do conhecimento mais profundo de Deus. Oh, se as almas pudessem saber disso! Ó meu Deus, se eu pudesse conseguir atingir mais um desses graus, de boa vontade haveria de suportar por inteiro os tormentos que sofreram [todos] os mártires juntos. (68) Realmente, todos esses tormentos parecem-me nada em comparação com a glória que nos espera por toda a eternidade. Ó Senhor, mergulhai a minha alma no oceano de Vossa Divindade e concedei-me a graça de Vos conhecer melhor, porque, quanto mais Vos conheço, tanto mais ardentemente Vos desejo e aumenta o meu amor para Convosco. Sinto na minha alma um abismo profundo que apenas Deus pode preencher. Dissolvo-me Nele como uma gota no oceano. Rebaixou-se o Senhor até a minha miséria como o raio de sol à terra deserta e pedregosa, e, no entanto, sob a influência dos Seus raios, a minha alma cobriu-se de vegetação, flores e frutos e tornou-se um belo jardim para o Seu repouso.
606Meu Jesus, apesar das Vossas graças, sinto e vejo toda a minha miséria. Começo o dia com luta e termino-o com luta. Mal dou conta de uma dificuldade e, em seu lugar, surgem (69) dez para serem combatidas. Mas não me preocupo com isso, porque sei bem que este é o tempo de luta; e não, de paz. Quando a intensidade da luta ultrapassa as minhas forças, jogo-me como uma criança nos braços do Pai Celestial e confio que não perecerei. Ó meu Jesus, como sou propensa ao mal. Isso me obriga a uma contínua vigilância sobre mim mesma, mas nada temo, confio na graça de Deus que é profusa justamente na maior miséria.
607Em meio às maiores dificuldades e contrariedades, não perco a paz interior nem o equilíbrio exterior, e é isso que leva os adversários ao desânimo. A paciência na adversidade fortalece a alma.
60802 de fevereiro [de 1936]. De manhã, quando acordei ao som da sineta, dominou-me uma grande sonolência e, não podendo despertar, tomei um banho frio e a sonolência deixou-me em dois minutos. Quando vim para a meditação, (70) todo um enxame de pensamentos absurdos encheu a minha cabeça, tive que combatê-los durante toda a meditação. A mesma coisa aconteceu durante as orações, mas, quando começou a santa Missa, reinou na minha alma um estranho silêncio e alegria. Então, vi a Mãe Santíssima com o Menino Jesus e São José[300], que estava parado atrás dela. A Mãe Santíssima disse-me: Eis aqui o teu maior tesouro. — E entregou-me o Menino Jesus. Quando O recebi nos meus braços, desapareceram a Mãe Santíssima e São José, e fiquei sozinha com o Menino Jesus. Eu Lhe disse: “Sei que Vós sois o meu Senhor e Criador, embora sejais tão pequeno”.
609Jesus estendeu Suas mãozinhas e, sorrindo, olhava para mim — o meu espírito estava cheio de incomparável alegria. E de repente desapareceu Jesus; estava na hora da santa Comunhão. Dirigi-me com as outras irmãs ao altar, com a alma compenetrada. Depois da santa Comunhão, (71) ouvi na alma estas palavras: Eu sou, no teu coração, o mesmo que tinhas nos braços. Então pedi ao Senhor por certa alma[301], a fim de que o Senhor lhe concedesse graça para a luta e afastasse essa provação. — Será como pedes, mas o mérito dele não diminuirá. A alegria reinou no meu coração por Deus ser tão bom e misericordioso; Deus dá tudo o que Lhe pedimos com confiança.
610Após cada conversa com o Senhor, a minha alma fica estranhamente fortalecida. Uma espécie de paz profunda reina na minha alma e me faz tão corajosa que nada no mundo me assusta; tenho apenas um receio: o de entristecer Jesus.
611Ó meu Jesus, suplico-Vos pela bondade do Vosso dulcíssimo Coração, acalme-se a Vossa ira e manifeste-nos a Vossa misericórdia. Vossas Chagas sejam nossa defesa diante da justiça (72) do Vosso Pai. Conheci-Vos, ó Deus, como fonte de misericórdia que vivifica e alimenta cada alma. Oh, como é grande a misericórdia do Senhor, acima de todos os Seus atributos. A Misericórdia é o maior atributo de Deus; tudo o que está em minha volta me fala disso. A Misericórdia é a vida das almas, a Sua compaixão é inesgotável. Ó Senhor, olhai para nós e procedei conosco de acordo com a Vossa imensurável piedade, de acordo com a Vossa imensa misericórdia.
612Em determinado momento, tive dúvidas sobre se aquilo que me sucedera não teria ofendido gravemente a Nosso Senhor. Como não poderia discernir isso, decidi não comungar antes de me confessar, embora imediatamente tenha despertado a contrição, porque tenho o costume de me exercitar na contrição após a mínima falta. Nos dias em que não recebia a santa Comunhão (73), não sentia a presença de Deus. Sofria indizivelmente por esse motivo, mas suportava-o como castigo pelo pecado. Contudo, na confissão, fui censurada; podia ter recebido a santa Comunhão, pois o que me sucedera não era impedimento. Depois da confissão fui comungar e subitamente vi o Senhor, que me disse estas palavras: Fica sabendo Minha filha, que por não te unires a Mim na santa Comunhão Me causaste maior pesar do que por essa pequena falta.
613Um dia, vi uma capelinha e nela seis irmãs que recebiam a santa Comunhão, dada pelo nosso confessor, vestido de sobrepeliz e estola[302]. Nessa capela não havia nem decoração, nem genuflexórios. Depois da santa Comunhão, vi Nosso Senhor como está representado na Imagem. Jesus ia se afastando e eu exclamei: “Senhor, como podeis passar por mim e não me dizer nada? Eu, (74) sozinha, nada farei sem Vós, tendes que ficar comigo, abençoar-me, a mim e a esta congregação e também a minha pátria”. Jesus fez o sinal da cruz e disse: Nada temas, Eu estou sempre contigo.
614Nos dois últimos dias antes da Quaresma, tivemos, juntamente com as educandas[303], uma hora de adoração reparadora. Nessas duas horas, vi Jesus tal como depois da flagelação. Uma dor tão grande oprimiu minha alma que me parecia sentir todos esses tormentos no meu próprio corpo e na minha própria alma.
61501.03.1936. Nesse dia, durante a santa Missa, envolveu-me uma estranha força e um impulso para começar a realizar os desejos de Deus[304]. Vinha-me uma compreensão tão clara dessas coisas que o Senhor me pedia que, em verdade, se eu me justificasse (75) dizendo que não as entendia, mentiria, porque o Senhor me fez conhecer clara e distintamente a Sua vontade, e eu não tinha a esse respeito nem uma sombra de dúvida. Compreendi que seria a maior ingratidão adiar por mais tempo essa obra que o Senhor quer realizar para a Sua glória e para o proveito de um grande número de almas, servindo-se de mim como mísero instrumento para concretizar Seus eternos planos de misericórdia. Realmente, como seria ingrata a minha alma se por mais tempo resistisse à vontade de Deus. Nada mais me impedirá de realizá-la, nem a perseguição, nem o sofrimento, nem as zombarias, nem as ameaças, nem os pedidos, nem a fome, nem o frio, nem as adulações, nem as amizades, nem as adversidades, nem os amigos, nem os inimigos, nem estas coisas pelas quais estou passando, nem as coisas futuras, nem o ódio do inferno — nada mesmo me impedirá de cumprir a vontade de Deus. (76) Não me baseio nas minhas próprias forças, mas na Sua onipotência, porque, se me deu a graça de conhecer a Sua santa vontade, também me concederá a graça de realizá-la.
Não posso deixar de mencionar quanto se opõem a esta minha aspiração a minha natureza inferior, que avança com suas exigências. E disso resulta, por vezes, uma luta tão grande na alma que, como Jesus no Jardim das Oliveiras, também eu clamo a Deus Pai Eterno: “Se possível, afastai de mim este cálice, mas seja feita a Vossa vontade; não como eu quero, mas como Vós, Senhor, quereis”. Para mim não é mistério tudo aquilo pelo que deverei passar, mas, com plena consciência, aceito tudo o que me enviardes, Senhor. Confio em Vós, Deus misericordioso, e desejo demonstrar eu primeiro essa confiança que exigis das almas. Ó Verdade eterna, ajudai-me e iluminai-me nos caminhos da vida e fazei que se cumpra em mim a Vossa vontade.
(77) Nada desejo, a não ser o cumprimento da Vossa vontade, Deus meu. Não importa se será fácil ou difícil, pois sinto que uma força estranha me impele à ação, e a única coisa que me detém — é a santa obediência. Ó meu Jesus, Vós me impelis e, por outro lado, me segurais e me retendes. Ó meu Jesus, também nisso faça-se a Vossa vontade.
Permaneci nesse estado vários dias sem interrupção, minhas forças físicas diminuíram e, embora eu nada dissesse disso a ninguém, a madre superiora[305] percebeu o meu sofrimento e disse: “Notei que a irmã está diferente e muito pálida”. — Recomendou que eu fosse descansar mais cedo e dormisse bastante, e à noite mandava-me trazer uma caneca de leite quente. Seu coração solícito e verdadeiramente materno queria me ajudar, mas as coisas exteriores não têm influência sobre os sofrimentos do espírito (78) e não trazem muito alívio. No confessionário eu hauria força e consolo, ao saber que já não terei que esperar muito para pôr mãos à obra.
616Na quinta-feira, quando ia para a cela, vi acima de mim uma Hóstia Santa em grande claridade. Então ouvi uma voz que me parecia vir do alto da Hóstia: Nela está a tua força, Ela te defenderá. — Após essas palavras desapareceu a visão, mas uma misteriosa força entrou na minha alma e uma estranha luz me fez conhecer em que consiste o nosso amor a Deus, que é o cumprimento da vontade de Deus.
617Ó Santíssima Trindade, Deus eterno, desejo brilhar na coroa da Vossa misericórdia como uma pequenina pedra, cuja beleza dependa do Vosso raio de luz (79) e da Vossa inconcebível misericórdia. Tudo que é belo na minha alma é Vosso, ó Deus; por mim mesma, sou sempre nada.
618No começo da Quaresma, pedi ao meu confessor uma mortificação para este período, e recebi a mortificação de não reduzir a minha alimentação, mas, enquanto comesse — devia refletir sobre como Nosso Senhor aceitou, na cruz, vinagre com fel: esta seria a mortificação. Não sabia que tiraria tão grande proveito para a minha alma. Esse proveito é que continuamente reflito sobre a Sua dolorosa Paixão e, quando me alimento, não distingo o que como, mas estou ocupada com a morte de Meu Senhor.
619Também pedi, no início da Quaresma, uma alteração no meu exame particular. Recebi, como indicação, que tudo o que eu fizesse — fosse na intenção pura de desagravo pelos pecadores, (80) o que me manteve em contínua união com Deus. Essa intenção aperfeiçoa os meus atos, porque tudo que faço, faço pelas almas imortais. Todas as dificuldades e cansaços nada são, quando me lembro que reconciliam as almas pecadoras com Deus.
620Maria é minha Mestra, que me ensina sempre como viver para Deus. O meu espírito resplandece na Vossa mansidão e humildade, ó Maria.
621Uma vez, quando entrei na capela para uma adoração de cinco minutos, e estava rezando por certa alma, compreendi que nem sempre Deus aceita as nossas orações por aquelas almas pelas quais rezamos, mas destina-as a outras almas e, mesmo que não proporcionemos alívio para os sofrimentos no fogo do purgatório, contudo, a nossa oração não se perde.
622(81) Convivência confidencial da alma com Deus. Deus aproxima-se da alma de uma maneira especial, conhecida apenas por Deus e pela alma. Ninguém percebe essa união misteriosa. Nessa união preside o amor e é só o amor que realiza tudo. Jesus se comunica com a alma de forma delicada e doce, e no Seu âmago há Sua paz. Jesus lhe concede muitas graças, torna a alma capaz de participar dos Seus pensamentos eternos e, algumas vezes, desvenda à alma Seus divinos desígnios.
623Frei Andrasz me disse que seria bom se existisse na Igreja de Deus um grupo de almas que implorassem a misericórdia de Deus, porque realmente nós todos necessitamos dessa misericórdia. Depois dessas palavras, uma extraordinária luz entrou na minha alma. Oh, como é bom o Senhor.
624(82) 18.03.1936. Num certo momento, pedi a Jesus que Ele mesmo desse o primeiro passo provocando alguma mudança, ou algum ato exterior, ou que me expulsassem, porque eu mesma não estava em condições de abandonar esta congregação; e nesse estado de ânimo eu agonizei por mais de três horas. Eu não podia rezar, mas submetia a minha vontade à vontade de Deus. No dia seguinte, de manhã, a madre superiora[306] me disse: “A madre geral[307] vai transferir a irmã para Varsóvia”. Respondi-lhe que era talvez melhor eu não ir, uma vez que vou sair imediatamente da congregação aqui. Pensei que se tratava daquele sinal exterior que tinha pedido a Deus. A madre superiora [não] respondeu a isso, mas em seguida me chamou novamente e disse: “De qualquer modo, a irmã vá, e não leve em conta a viagem perdida, ainda que tenha de regressar logo em seguida”. Respondi — que sim, que iria. Embora a dor me transpassasse a alma, porque sabia(83) que, com a viagem, seria adiada aquela questão. Porém, apesar de tudo, procuro sempre ser obediente.
625À noite, quando eu rezava, disse-me a Mãe de Deus: Vossa vida deve ser semelhante à minha: silenciosa e oculta, continuamente unida a Deus, em súplica pela humanidade e a preparar o mundo para a segunda vinda de Deus.
626À noite, durante a bênção[308], a minha alma, por um momento, conviveu com Deus Pai. Senti que estava nas Suas mãos como uma criança e ouvi interiormente estas palavras: Nada temas, Minha filha, todos os adversários fracassarão aos Meus pés. — Depois dessas palavras, entrou na minha alma uma paz profunda e uma extraordinária calma interior.
627(84)Quando me queixava ao Senhor por me tirar essa ajuda e dizia que novamente ficaria sozinha e não saberia como proceder, ouvi estas palavras: Não temas, Eu sempre estou contigo. Após essas palavras, novamente uma profunda paz entrou na minha alma. Sua presença atravessou-me toda de maneira sensível. Meu espírito estava inundado de luz, e mesmo o corpo participava disso.
628À noite, no último dia da minha permanência em Vilnius, uma irmã[309], já idosa, desvendou-me o estado da sua alma. Disse que já havia alguns anos sofria interiormente, que lhe parecia que todas as suas confissões eram mal feitas e que tinha dúvidas sobre o perdão de Nosso Senhor. Perguntei-lhe se, alguma vez, tinha falado disso ao confessor. Respondeu-me: “Já, várias vezes (85) tenho falado disso aos confessores — e eles sempre me dizem que eu fique tranquila e, no entanto, sofro muito e nada me traz alívio e sempre me parece que Deus não me perdoou”. — Respondi a ela: “A irmã deve ser obediente ao confessor e ficar inteiramente tranquila, porque com certeza se trata de tentação”. Ela, no entanto, suplicava-me com lágrimas nos olhos que eu perguntasse a Nosso Senhor se lhe havia perdoado e se suas confissões eram boas ou não. Respondi-lhe energicamente: “A irmã mesma pergunte, se não confia nos confessores”. Mas ela pegou-me pela mão e não queria soltar. Pedia que eu rezasse por ela e transmitisse para ela o que a seu respeito Nosso Senhor me dissesse. Chorando amargamente, retinha-me, dizendo: “Eu sei que Jesus fala com a irmã”. Não podendo desprender-me dela, porque me segurava pela mão, prometi-lhe que (86) rezaria por ela. À noite, durante a bênção, ouvi na alma estas palavras: Diz-lhe que mais fere o Meu Coração a sua incredulidade do que os pecados que cometeu. — Quando lhe falei disso, chorou como uma criança e uma grande alegria encheu a sua alma. Compreendi que Deus desejava consolar essa alma por meu intermédio e, embora isso me custasse muito, cumpri o desejo de Deus.
629Nessa mesma noite, quando entrei por um momento na capela, para agradecer a Deus por todas as graças que me havia concedido nesta casa, a Sua presença envolveu-me de repente. Sentia-me como uma criança nos braços do melhor Pai e ouvi estas palavras: Nada temas, Eu estou sempre contigo. Seu amor transpassou-me por completo, e senti que estava entrando numa familiaridade tão estreita com Ele (87) que não posso expressá-lo com palavras.
630Então, vi a meu lado um dos sete espíritos, radiante como anteriormente, sob uma forma luminosa. Continuamente via-o a meu lado e, mesmo enquanto estava viajando de trem, eu o via[310]. Reparei que em cima de cada uma das igrejas por onde passava encontrava-se um anjo, embora envolvido por uma luz mais pálida do que a do espírito que me acompanhava na viagem. E cada um dos espíritos que cuidavam dos santuários inclinava-se diante desse espírito que me acompanhava. Quando atravessei o portão do convento em Varsóvia, esse espírito desapareceu. Agradeci a Deus por Sua bondade, por nos dar anjos por companheiros[311]. Oh, como as pessoas consideram pouco o fato de terem sempre perto de si um hóspede como esse, que é, ao mesmo tempo, testemunha de tudo! Pecadores, lembrai-vos de que também vós tendes uma testemunha dos vossos atos.
631Ó meu Jesus, a Vossa bondade ultrapassa todo o entendimento e ninguém esgotará a Vossa misericórdia. Só existe a perdição (88) para a alma que quer se perder — porque a que deseja a salvação, para esta existe o mar inesgotável da misericórdia do Senhor. E como pode um pequeno vaso conter em si o mar profundo?
632Quando me despedia das irmãs, no momento da partida, uma delas desculpou-se muito por me ter ajudado tão pouco nas minhas tarefas, e porque não apenas não me ajudava, mas procurava sempre torná-las mais difíceis. Contudo, eu a considerava na minha alma como uma grande benfeitora, porque me exercitou na paciência. A tal ponto me exercitou que uma das irmãs mais velhas observou: “A irmã Faustina ou é boba, ou é santa, porque realmente uma pessoa normal não toleraria que alguém sempre a tratasse tão acintosamente”. Eu, no entanto, (89) sempre me aproximava dela com bondade. Essa irmã buscava de tal forma dificultar o meu trabalho que, apesar do meu esforço, ela conseguia, às vezes, estragar alguma coisa do que estava bem feito — como ela mesma confessou ao se despedir de mim, pedindo-me muitas desculpas. Não quis entrar nas suas intenções, mas considerei isso como uma provação de Deus...
633Admiro-me muito como se pode ter tanta inveja. Eu, vendo o bem de alguém, alegro-me com isso, como se eu mesma o possuísse. A alegria dos outros é minha alegria, e o sofrimento dos outros é meu sofrimento, porque de outra forma eu não ousaria conviver com Nosso Senhor. O espírito de Jesus é sempre simples, bondoso, sincero. Toda maldade, inveja e inimizade, encobertas com o sorriso da amizade, são como pequenos diabos astutos. Uma palavra severa, mas decorrente de um amor sincero, não fere o coração.
634(90) 22.03.1936. Quando cheguei a Varsóvia, entrei por um momento na pequena capela, para agradecer ao Senhor pela feliz viagem e pedir-Lhe ajuda e graça, para tudo que aqui me esperava — submeto-me em tudo à Sua santa vontade. E ouvi estas palavras: Nada temas, todas as dificuldades servirão para que a Minha vontade se realize.
635Dia 25 de março. Durante a meditação da manhã, envolveu-me a presença de Deus de uma maneira especial. Contemplei a incomensurável grandeza de Deus e, ao mesmo tempo, a Sua condescendência para com a criatura. Então, vi a Mãe de Deus, que me disse: Oh, como é agradável a Deus a alma que segue fielmente a inspiração da Sua graça! Eu dei o Salvador ao mundo e, quanto a ti, deves falar ao mundo da Sua grande misericórdia, preparando-o para a Sua (91) segunda vinda, quando virá não como Salvador misericordioso, mas como justo Juiz. Oh, quão terrível será esse dia! Está decidido o dia da justiça, o dia da ira de Deus; os próprios anjos tremem diante dele. Fala às almas dessa grande misericórdia, enquanto é tempo de compaixão. Se tu te calares agora, terás de responder naquele dia terrível por um grande número de almas. Nada receies, sê fiel até o fim, Eu me compadeço de ti.
636Quando cheguei a Walendów[312], uma das irmãs[313], ao me cumprimentar, disse-me: “Uma vez que a irmã chegou aqui, agora já tudo estará bem”. Perguntei-lhe: “Por que a irmã está falando assim?”. E ela me respondeu que assim estava sentindo na alma. Essa almazinha é cheia de simplicidade e muito agradável ao Coração de Jesus. Esta casa, realmente, encontrava-se em uma penúria[314] fora do comum... mas não vou falar de tudo aqui.
637(92)Confissão. Quando me preparava para a confissão, disse a Jesus oculto no Santíssimo Sacramento: “Jesus, peço-Vos, falai-me pela boca desse sacerdote[315], e que o sinal disso seja que ele, não sabendo que Vós, Jesus, exigis de mim essa fundação da Misericórdia, me diga alguma coisa sobre isso”. Quando me aproximei do confessionário e comecei a confissão, o sacerdote interrompeu-me e começou a falar-me sobre a grande misericórdia de Deus, e com tanta ênfase como eu nunca antes tinha ouvido falar, e perguntou-me: “Você sabe que a misericórdia do Senhor está acima de todas as Suas obras, que é o coroamento das Suas obras?” E eu prestava atenção a essas palavras que o Senhor me dizia pela boca do sacerdote. Embora eu creia que, no confessionário, Deus sempre fala pela boca do sacerdote, contudo, aí fui testemunha disso de uma maneira especial. (93) Embora eu não me tivesse desvendado em absoluto quanto à vida divina que existe em minha alma, acusando-me apenas das faltas, contudo, esse sacerdote me disse muito sobre o que se passa na minha alma e obrigava-me à fidelidade às inspirações divinas. Disse-me: “Siga pela vida com Nossa Senhora, que respondia fielmente a cada inspiração de Deus”. — Ó meu Jesus, quem compreenderá a Vossa bondade?
638Jesus, afastai de mim os pensamentos que não estejam de acordo com a Vossa vontade. Estou vendo que nada mais me prende à terra, a não ser esta obra da misericórdia.
639Quinta-feira. Durante a adoração noturna, vi o Senhor, flagelado e martirizado, que me disse: Minha filha, desejo que sejas dependente do confessor nas mínimas coisas. Os teus maiores sacrifícios não Me agradam, se os fazes sem a autorização (94) do confessor e, em compensação, o mínimo sacrifício tem grande significado a Meus olhos, se é feito com a permissão do confessor. As maiores obras não têm valor a Meus olhos, quando arbitrariamente realizadas; frequentemente não estão de acordo com a Minha vontade e merecem antes castigo do que recompensa. Mas a tua menor ação, feita com a autorização do confessor, é agradável a Meus olhos e Me é imensamente cara. Confirma-te nisso para sempre, fica sempre alerta, porque todo o inferno conspira contra ti, por causa desta obra, visto que muitas almas se afastarão das portas do inferno e glorificarão a Minha misericórdia. Mas não tenhas nenhum medo, porque Eu estou contigo; reconhece que nada podes por ti mesma.
640Na primeira sexta-feira, antes da Comunhão vi um grande cibório (95) repleto com Hóstias consagradas. Alguma mão colocou esse cibório próximo de mim. Peguei-o em minhas mãos, e havia nele mil Hóstias vivas. Então, ouvi uma voz: Estas Hóstias são recebidas pelas almas para as quais obtiveste a graça de uma sincera conversão durante esta Quaresma, — isso aconteceu uma semana antes da Sexta-Feira Santa. Passei esse dia em grande recolhimento interior, mortificando-me em favor das almas.
641Oh, que alegria poder mortificar-me em favor das almas imortais! Sei que o grão de trigo, para se tornar alimento, tem que ser esmagado e triturado entre as mós. Assim também eu, para ser útil à Igreja e às almas, tenho que ser destruída, embora exteriormente ninguém perceba o meu sacrifício. Ó Jesus, quero ficar oculta exteriormente, como essa Hóstia, na qual o olho nada percebe. E eu sou uma hóstia a Vós consagrada.
642(96) Domingo de Ramos. Nesse domingo, experimentei de maneira especial os sentimentos do dulcíssimo Coração de Jesus. O meu espírito se encontrava onde estava Jesus. Via Nosso Senhor montado no burrinho, os discípulos e as grandes multidões que O acompanhavam, cheias de júbilo, com ramos nas mãos. Uns os jogavam aos pés de Jesus, que passava, outros os agitavam no ar, pulando e saltando diante do Senhor, sem saber o que fazer de alegria. E vi uma outra multidão, e pequenas crianças, que saiam ao encontro de Jesus da mesma forma, com rostos radiantes de alegria e com ramos nas mãos, que incessantemente gritavam de alegria — mas Jesus estava muito sério. O Senhor deu-me a conhecer como sofreu nessa hora. Nesse momento, eu nada mais via, a não ser Jesus, que tinha o Coração saturado de ingratidão.
643 (97) Confissão trimestral. Frei Bukowski[316]. Quando novamente uma força interior me impelia a que eu não adiasse por mais tempo essa questão, não conseguindo paz, falei disso ao confessor frei Bukowski e disse-lhe que já não podia aguardar mais. O padre respondeu-me: “Irmã, isso é uma ilusão. Nosso Senhor não pode exigir isso. A irmã tem votos perpétuos, tudo isso é um engano. A irmã está inventando uma espécie de heresia”. — E ralhou comigo, quase em voz alta. Perguntei-lhe se, de fato, tudo seria ilusão; — respondeu-me que sim. “E como devo proceder? Diga-me, padre!” — “Pois bem, a irmã não pode seguir nenhuma inspiração, deve ficar distraída, não prestar atenção ao que ouvir na alma, procurar exteriormente cumprir bem as suas obrigações e, sobre essas coisas, não pensar absolutamente. Viver em total distração”. Respondi: “Está bem, (98) até agora eu tenho procedido de acordo com minha própria consciência, mas a partir de agora, se o padre manda que eu não preste atenção à minha vida interior, deixarei então de o fazer”. — E ele disse: “Se Nosso Senhor novamente lhe disser alguma coisa, faça o favor de me contar, mas a irmã por si mesma não tome qualquer iniciativa”. — Respondi: “Está bem, procurarei ser obediente”. Mas não sabia por que o padre estava tão severo comigo.
644Quando me afastei do confessionário, todo um enxame de pensamentos oprimiu minha alma: por que motivo ser sincera? Pois, afinal, o que eu disse não é pecado e, portanto, não tenho obrigação de falar disso ao confessor; ou então: que alívio, já não preciso me importar com a minha vida interior, contanto que exteriormente tudo esteja bem. Agora não preciso prestar atenção, nem seguir essas vozes interiores que, muitas vezes, me têm custado tantas humilhações. A partir daqui serei livre. Mas de novo uma dor (99) estranha oprimiu a minha alma: então não me é permitido conviver com Aquele a quem tão ardentemente desejo? Aquele que é toda a força da minha alma? Comecei a exclamar: “A quem me dirigirei, ó Jesus?”. Mas, a partir desse momento da proibição do confessor, desceram na minha alma grandes trevas. Tenho medo de ouvir alguma voz interior e, assim, transgredir a ordem do confessor e, novamente, agonizo de saudade de Deus. O meu interior está dilacerado, não tendo vontade própria, já que [estou] inteiramente entregue a Deus.
Isso aconteceu na Quarta-Feira Santa; esse sofrimento intensificou-se na Quinta-Feira Santa. Quando vim para a meditação, entrei numa espécie de agonia, não sentia a presença de Deus, mas toda a Sua justiça pesou sobre mim. Via-me como que esmagada pelos pecados do mundo. O demônio começou a zombar de mim: “Estás vendo como agora não vais buscar a salvação das almas. Olha o pagamento que recebeste. Ninguém (100) acreditará que Jesus está exigindo isso. Olha o que estás sofrendo agora e o que vais sofrer ainda, pois agora o confessor já te liberou de tudo isso”. — Agora posso viver como me aprouver, contanto que exteriormente tudo esteja bem. Esses pensamentos terríveis atormentaram-me uma hora inteira. Quando se aproximava a hora da santa Missa, a dor me apertou o coração — então eu tenho que sair da congregação? E se o padre me disse que se trata de uma heresia, tenho que me afastar da Igreja? Chamei com uma voz interior e dolorosa pelo Senhor: “Jesus, salvai-me”. Contudo nem um raio de luz entrava em minha alma e sentia que as forças estavam me abandonando como se o corpo se estivesse separando da alma. Submetia-me à vontade divina e repetia: “Faça-se comigo, ó Deus, segundo o que decidistes, em mim já nada existe de meu”. Então, de repente, envolveu-me a presença de Deus e transpassou-me toda até a medula dos ossos. (101) Era a hora de receber a santa Comunhão. Logo depois da Comunhão, perdi a consciência de tudo que me cercava e de onde eu estava.
645Então, vi Nosso Senhor como está pintado na Imagem. Ele me disse: Diz ao confessor que essa obra é Minha e que estou te utilizando como um modesto instrumento. — E eu disse: “Jesus, eu nada posso fazer do que me mandais, porque o confessor me disse que tudo isso é ilusão, e não devo obedecer a qualquer ordem Vossa e nada devo fazer do que me recomendardes agora. Perdoai-me, Senhor, nada posso fazer, eu tenho que obedecer ao confessor. Jesus, peço-Vos perdão de todo o coração. Vós sabeis quanto estou sofrendo por esse motivo, mas paciência, Jesus, o confessor não me permitiu seguir as Vossas ordens”. — Jesus ouvia com bondade e satisfação esses meus argumentos e queixas. Eu pensava (102) que isso ofenderia muito a Nosso Senhor, mas, ao contrário, Jesus estava satisfeito e disse-bondosamente: Fala sempre ao confessor de tudo o que Eu te recomendo e digo, e faz apenas aquilo para o que obtiveres autorização. Não te assustes e não tenhas medo, Eu estou contigo. — A minha alma encheu-se de alegria. Desapareceram todos os pensamentos que me atormentavam, e a certeza e a coragem voltaram à minha alma.
646Em seguida, porém, comecei a sofrer os tormentos que Jesus sofreu no Jardim das Oliveiras. Isso durou até sexta-feira de manhã. Na sexta-feira, vivi a Paixão de Jesus, mas já de outra forma. Nesse dia, veio de Derdy nos visitar o frei Bukowski. Uma força estranha me impelia a confessar-me e contar tudo o que me sucedera e o que Jesus me disse. Quando falei disso ao padre, ele estava completamente diferente e me (103) disse: “A irmã não tenha medo, nada de mal lhe acontecerá, porque Nosso Senhor não permitirá. Se a irmã for obediente e perseverar nessa disposição, não precisa preocupar-se. Deus encontrará uma maneira de realizar essa obra. Mantenha sempre essa simplicidade e fale de tudo à madre geral. O que eu disse foi para prevenir a irmã, porque até pessoas santas têm ilusões e, a isso, pode se juntar ainda alguma sugestão do demônio e, às vezes, de nós mesmos. Portanto é preciso tomar cuidado. A irmã continue procedendo como até agora. A irmã está vendo que Nosso Senhor não está zangado com isso. A irmã pode repetir essas coisas que agora lhe sucederam ao seu confessor permanente”[317].
647Uma coisa eu compreendi: que devo rezar muito por cada um dos meus confessores pedindo as luzes do Espírito Santo (104), porque, quando me aproximo do confessionário e antes não rezo com fervor, o confessor não me compreende muito. Esse padre estimulava-me a rezar com fervor na intenção de que Deus dê a conhecer e compreender melhor essas coisas que está exigindo de mim: “A irmã faça uma novena após outra, e Deus não lhe negará as graças”.
648Sexta-Feira Santa. Às três horas vi Jesus crucificado, que olhou para mim e disse: Tenho sede. — Então, vi que do Seu lado saíam os mesmos dois raios que estão na Imagem. Então, senti na alma um desejo de salvar almas e de aniquilar-me pelos pobres pecadores. Ofereci-me em sacrifício ao Pai Eterno pelo mundo inteiro, com Jesus agonizante. Com Jesus, por Jesus (105) e em Jesus está a minha união Convosco, Pai Eterno. Na Sexta-Feira Santa Jesus já estava sofrendo na alma de uma forma diferente do que na Quarta-Feira Santa.
649Páscoa [12.4.1936]. Quando entrei na capela, o meu espírito mergulhou em Deus, meu único tesouro. A Sua presença [me] inundou.
650Ó meu Jesus, meu Mestre e Guia, fortalecei-me, iluminai-me nesses momentos difíceis da minha vida. Não espero ajuda dos homens. Em Vós está toda a minha esperança. Sinto que estou sozinha diante das Vossas exigências, Senhor. Apesar dos receios e aversões da natureza, estou cumprindo a Vossa santa vontade e desejo cumpri-la o mais fielmente possível durante toda a vida e na hora da minha morte. Jesus, Convosco tudo posso, fazei comigo o que Vos aprouver, dai-me apenas o Vosso Coração misericordioso, e isso me basta.
(106) Ó meu Jesus e meu Senhor, ajudai-me. Faça-se comigo o que decidistes antes dos séculos. Estou pronta a obedecer a todo aceno da Vossa santa vontade. Iluminai a minha mente, para que eu possa conhecer qual é a Vossa vontade. Ó Deus, que perscrutais a minha alma, bem sabeis que nada desejo senão a Vossa glória.
Ó vontade divina, sois a delícia do meu coração, alimento da minha alma, luz da minha mente, força onipotente da minha vontade, porque, quando me uno com Vossa vontade, Senhor, o Vosso Poder age através de mim e ocupa o lugar da minha fraca vontade. Todos os dias procuro cumprir o desejo de Deus.
651Ó Deus inconcebível, como é imensa a Vossa misericórdia![318] Ela ultrapassa todo o entendimento humano e angélico juntos. Todos os anjos (107) e homens saíram das entranhas da Vossa misericórdia. A misericórdia é a flor do amor. Deus é amor; e a misericórdia, a Sua obra. No amor se concebe; na misericórdia se manifesta. Tudo que vejo me fala da Sua misericórdia. Até a própria justiça de Deus fala-me da Sua imperscrutável misericórdia, porque a justiça nasce do amor.
652Há uma palavra a que eu dou especial atenção e que continuamente pondero; essa única palavra é tudo para mim, com ela vivo e com ela morro — é a santa vontade de Deus. Ela é meu alimento cotidiano. Toda a minha alma está concentrada nos desejos de Deus e faço sempre o que Deus exige de mim, embora, muitas vezes, a minha natureza possa tremer e sentir que a Sua grandeza ultrapassa as minhas forças. Bem sei o que sou por mim mesma, mas igualmente sei bem o que é a graça de Deus, que me fortifica.
653(108)25.04.1936. Walendów. Nesse dia, o sofrimento na minha alma era bem grande, o que raramente acontece. Desde a manhã, eu sentia como que a separação do corpo e da alma. Sentia que Deus invadia-me totalmente, sentia toda a justiça de Deus em mim, sentia que estou sozinha diante de Deus. Pensei que uma só palavra do diretor espiritual me tranquilizaria, mas o que fazer, se ele não estava aqui? No entanto, decidi buscar luzes na santa confissão. Quando desvendei a minha alma, o sacerdote[319] tinha medo de continuar a me ouvir em confissão, e isso me levou a um sofrimento ainda maior. Quando noto o receio de algum sacerdote, então não obtenho nenhuma tranquilidade interior; por isso, decidi que procurarei desvendar a minha alma em tudo apenas diante do diretor espiritual, desde as maiores coisas até as menores, e que seguirei estritamente a sua orientação.
654Agora compreendo que a confissão é apenas (109) dizer os pecados, e a direção espiritual é algo inteiramente diferente, mas não é disso que quero falar. Quero contar essa coisa estranha, que me aconteceu pela primeira vez; quando o confessor começou a me falar, eu não compreendia nenhuma palavra que ele dizia; então, de repente, vi Nosso Senhor Crucificado, que me disse: busca forças e luzes na Minha Paixão. Terminada a confissão, comecei a refletir sobre a terrível Paixão de Jesus e compreendi que o que eu sofro nada é em comparação com a Paixão do Salvador, e que toda imperfeição, ainda que mínima, era a causa dessa terrível Paixão. Então, a minha alma foi envolvida por uma grande contrição e só então senti que me encontro no mar da insondável misericórdia de Deus. Oh, como tenho poucas palavras para expressar o que estou sentindo. Sinto que sou como uma gota de orvalho arrebatada para a profundeza do imenso oceano da misericórdia de Deus.
655(110) † 11 de maio de 1936. Vim para Cracóvia e fiquei feliz porque agora já poderei cumprir tudo o que Nosso Senhor estava exigindo.
Certa vez, quando me encontrei com frei A.[320] e lhe contei tudo, recebi esta resposta: “A irmã reze até o dia da festa do Sagrado Coração de Jesus e junte com a oração alguma mortificação, que, no dia do Coração de Jesus, darei uma resposta à irmã”. Contudo, certo dia, ouvi na alma esta voz: Nada temas, Eu estou contigo. E depois dessas palavras senti na minha alma um impulso tão grande que não esperei pela festa do Coração de Jesus, mas declarei na confissão que iria imediatamente deixar a congregação[321]. Respondeu-me o padre: “Se a irmã decidiu sozinha, sozinha tome a responsabilidade por si mesma, portanto pode ir”. — Fiquei feliz por já estar de saída.
No dia seguinte, pela manhã, de repente abandonou-me (111) a presença de Deus. Grandes trevas envolveram a minha alma. Não conseguia rezar; em consequência desse repentino abandono de Deus, decidi adiar um pouco essa questão, até falar de novo com o padre.
Respondeu-me frei Andrasz que mudanças assim ocorrem com frequência nas almas e que isso não constitui um obstáculo para a ação.
656Quando conversava com a madre[322] sobre tudo o que tinha ocorrido, ela me respondeu com estas palavras: “Irmã, eu estou fechando a irmã no sacrário com Nosso Senhor. Aonde quer que a irmã vá, será a vontade de Deus”.
65719 de junho. Quando fomos à igreja dos Jesuítas para participarmos da procissão do Coração de Jesus, durante as vésperas vi saindo da Santíssima Hóstia os mesmos raios que estão pintados na Imagem. A minha alma foi envolvida por uma grande saudade de Deus.
658(112) Junho de 1936. Conversa com frei Andrasz.
“Saiba que essas coisas são difíceis e penosas. Seu diretor principal é o Espírito Santo. Nós apenas podemos orientar essas inspirações, mas o seu verdadeiro guia é o Espírito Santo. Se a própria irmã decidiu pela sua saída, eu nem lhe proíbo e nem lhe ordeno, aqui a irmã se responsabiliza por si mesma. Digo-lhe, irmã, que pode começar a agir; tem capacidades para isso, e então pode. São coisas possíveis, tudo isso que me disse antes e agora,[323] portanto é provável, mas é preciso tomar muito cuidado com tudo isso, rezar muito e pedir luzes para mim”.
659Durante a santa Missa, celebrada por frei Andrasz, vi o pequeno Menino Jesus, que me disse que em tudo devo depender dele: Qualquer ato arbitrário, ainda que (113) te custe muitos esforços, não Me agrada — e compreendi essa dependência.
660Ó meu Jesus, no dia do Juízo final Vós exigireis prestação de contas desta obra da misericórdia. Ó justo Juiz, mas também meu Esposo, ajudai-me a cumprir a Vossa santa vontade. Ó Misericórdia, virtude de Deus.
Ó misericordiosíssimo Coração de Jesus, meu Esposo, fazei o meu coração semelhante ao Vosso.
66116 de julho. Hoje passei a noite toda em oração; refleti sobre a Paixão do Senhor, e a minha alma era esmagada pela justiça de Deus. Atingiu-me o braço do Senhor.
66217 de julho. Ó meu Jesus, Vós sabeis das grandes contrariedades que encontro nessa causa, quantas acusações tenho que suportar, quantos sorrisos irônicos tenho que aceitar com calma. Oh, eu sozinha não conseguiria passar por isso, (114) mas Convosco tudo posso, meu Mestre. Oh, quão dolorosamente fere o sorriso irônico, quando se fala com grande sinceridade.
66322 de julho. Ó meu Jesus, sei que a grandeza do homem é comprovada pela ação e não pela palavra ou pelo sentimento. São as obras que de nós procedem que falarão de nós. Meu Jesus, não me permitais devaneios, mas dai-me coragem e força para cumprir a Vossa santa vontade.
Jesus, se quereis me deixar na incerteza, ainda que seja até o fim da vida, bendito seja nisso o Vosso santo Nome.
664Junho.
† Ó meu Jesus, como me alegro imensamente por me terdes dado a garantia de que essa congregação vai existir. Já não tenho nem sombra de dúvida quanto a isso e vejo que grande glória ela dará a Deus; será o reflexo do maior atributo que existe em Deus, isto é, a Misericórdia de Deus. Incessantemente (115) pedirão a misericórdia de Deus para si mesmas e para todo o mundo, e toda obra de caridade será decorrente do amor de Deus do qual estarão embebidas. Procurarão se familiarizar com esse grande atributo de Deus, viver com ele e esforçar-se para que outros o conheçam e confiem na bondade de Deus. Essa congregação da Misericórdia Divina será na Igreja de Deus tão escondida e silenciosa como uma colmeia num jardim magnífico. As irmãs trabalharão como abelhinhas, para alimentar de mel as almas do próximo, e a cera deve fluir para a glória de Deus.
665† 29 de junho de 1936
Frei Andrasz recomendou-me que fizesse uma novena, para obter um melhor conhecimento da vontade de Deus. Rezei ardentemente, acrescentando uma certa mortificação do corpo. No final da novena recebi luzes interiores e a garantia de que essa congregação existirá e será agradável a Deus. Apesar das dificuldades (116) e contrariedades, uma paz total e uma força do Alto dominou a minha alma. Conheci que nada pode resistir à vontade de Deus, nem opor-se a ela. Compreendi que devo cumprir essa vontade de Deus apesar das contrariedades, perseguições, sofrimentos de todo tipo, apesar das aversões e dos receios da minha natureza.
666Compreendi que todo o esforço para atingir a perfeição e toda a santidade consiste no cumprimento da vontade de Deus. O perfeito cumprimento da vontade de Deus é, sem sombra de dúvida, a plenitude da santidade. Receber a luz de Deus, conhecer o que Deus quer de nós e não fazê-lo é uma grande injúria à Sua majestade. Uma alma assim merece que Deus a abandone por completo. É semelhante a Lúcifer, que tinha tanta luz, mas não cumpria a vontade de Deus. Uma extraordinária paz dominou a minha alma quando comecei a refletir que, apesar das grandes dificuldades, eu sempre segui fielmente (117) a vontade de Deus conhecida. Ó Jesus, concedei-me a graça de pôr em prática a Vossa vontade, e tal como cheguei a conhecê-La, ó meu Deus.
66714 de julho. Às três horas recebi uma carta[324]. Ó Jesus, só Vós sabeis quanto estou sofrendo, mas ficarei calada e a ninguém falarei disso, porque sei que ninguém me consolará. Vós sois tudo para mim, ó meu Deus, e a Vossa santa vontade é o meu alimento; estou vivendo agora daquilo de que viverei na eternidade.
Tenho uma grande devoção por São Miguel Arcanjo. Ele não tinha um exemplo no cumprimento da vontade de Deus e, no entanto, cumpriu fielmente os desejos de Deus.
668† 15 de julho. Durante a santa Missa, ofereci-me em sacrifício ao Pai Celestial para tudo, através do dulcíssimo Coração de Jesus; que faça comigo o que Lhe aprouver. Eu, por mim mesma, nada sou e, na minha miséria, não tenho qualquer mérito. Por isso, ó Senhor, me lanço no mar da Vossa misericórdia.
669(117) 16 de julho. Estou aprendendo com Jesus a ser boa, com Aquele que é a própria bondade, para que eu possa ser chamada filha do Pai Celestial. Hoje, antes do meio-dia, tive um grande dissabor e, em meio a esse sofrimento, procurei unir a minha vontade com a vontade de Deus, louvando a Deus no meu silêncio. Depois do meio-dia fui fazer uma adoração de cinco minutos e, então, de repente, vi que o crucifixo que tenho sobre o peito se tornou vivo, e Jesus me disse: Minha filha, o sofrimento será para ti um sinal de que estou contigo. Depois dessas palavras, uma grande emoção invadiu a minha alma.
670Ó Jesus, meu Mestre e meu Guia, é só Convosco que sei conversar. Com ninguém tenho tanta facilidade para conversar como Convosco, ó Deus.
671Na minha vida espiritual, sempre me deixarei guiar pela mão do sacerdote. Sobre a vida da alma e suas necessidades, falarei apenas com o confessor.
672(119) † 4 de agosto de 1936. Tormento interior por mais de duas horas. Agonia... De repente, transpassa-me a presença de Deus, e sinto-me sob o poder da Sua justiça. Essa justiça atinge-me até a medula dos ossos, e exteriormente perco as forças e a consciência. Então conheço a grande santidade de Deus e a minha grande miséria. Surge na minha alma um terrível tormento; a alma vê que nenhuma das suas ações é sem mácula. De repente, desperta na minha alma a força da confiança... e a alma busca a Deus com toda a sua força, mas vê como é miserável e como é fútil tudo o que a cerca. E assim, diante dessa santidade — ó pobre alma...
67313 de agosto. Durante todo o dia fui atormentada por terríveis tentações; blasfêmias que me vinham à boca, aversão para com tudo o que era santo e divino. Contudo, lutei o dia todo. À noite, um pensamento começou a deprimir a minha mente: “Para que falar sobre isso ao confessor? (120) Ele vai rir disso”. Uma espécie de aversão e desânimo dominou a minha alma e parecia-me que, nesse estado, de forma alguma poderia receber a santa Comunhão. Quando pensei que não devia comungar, uma dor tão terrível oprimiu minha alma que por pouco não gritei na capela. Conscientizei-me, porém, de que as irmãs estavam ali e resolvi ir ao jardim e esconder-me, para poder, ao menos, chorar alto.
674Então, de repente, Jesus colocou-se ao meu lado e disse: Aonde tens a intenção de ir? Não respondi a Jesus, mas derramei toda a dor diante Dele e todas as tentações do demônio se afastaram. Jesus me disse: A paz interior que tens é uma graça — e de repente desapareceu. Eu me senti feliz e estranhamente calma. Realmente, só Jesus pode fazer que volte assim, de repente, uma tão grande paz, isto apenas Jesus pode fazer, Ele — o Senhor Altíssimo.
675(121) † 7 de agosto de 1936. Quando recebi o artigo[325] sobre a misericórdia divina com o santinho[326], invadiu-me de maneira extraordinária a presença de Deus. Ao mergulhar em oração de ação de graças, vi de repente Nosso Senhor numa grande claridade, como está pintado, e aos pés de Jesus vi o frei Andrasz e o padre Sopoćko. Ambos seguravam uma caneta nas mãos. Da ponta de ambas as canetas saíam feixes de luz e fogo, semelhante ao relâmpago, que atingiam uma grande multidão, dirigindo-se não se sabe aonde em sua corrida. Aqueles que eram atingidos por esse raio afastavam-se da multidão e estendiam os braços para Jesus. Uns voltavam com grande alegria; e outros, com muita dor e pesar. Jesus olhava com grande bondade para ambos. Em seguida, fiquei apenas com Jesus e disse: “Jesus, levai-me já, porque a Vossa vontade já foi cumprida”. E Jesus me respondeu: Ainda não se cumpriu em ti toda a Minha vontade, ainda sofrerás muito, mas Eu estou contigo, não tenhas medo.
676Falo muito com o Senhor sobre o frei Andrasz e também sobre o padre Sopoćko. Tenho a certeza de que o Senhor não me negará o que Lhe pedir, mas lhes dará o que estou pedindo. Senti e sei quanto Jesus os ama; não escrevo isso em detalhes, mas sei disso e me alegro imensamente.
677† 15 de agosto de 1936.
Durante a santa Missa, que foi celebrada pelo frei Andrasz, no momento antes da elevação a presença de Deus invadiu a minha alma, que foi atraída até o altar. Então vi a Mãe Santíssima com o Menino Jesus. O Menino Jesus segurava a mão da Mãe Santíssima. Em seguida, o Menino Jesus correu para o centro do altar com alegria, e a Mãe Santíssima me disse: Olha com quanta tranquilidade eu deixo Jesus nas mãos dele. Assim também tu deves (123) confiar a tua alma e ser uma criança diante dele. Depois dessas palavras, a minha alma ficou repleta de uma extraordinária confiança. A Mãe de Deus trazia um vestido branco, de uma brancura admirável, translúcida, nos ombros um manto límpido como o azul do céu, a cabeça descoberta, com os cabelos soltos, sublime e inconcebivelmente bela. Ela olhava com grande ternura para o frei Andrasz, mas em seguida ele fracionou esse lindo Menino e saiu realmente sangue vivo. O frei inclinou-se e recebeu esse Jesus vivo e verdadeiro. Se o comeu? Não sei como isso acontece. Jesus, Jesus, não consigo Vos acompanhar, porque, num momento, Vós Vos tornais incompreensível para mim.
678A essência das virtudes é a vontade de Deus. Quem cumpre fielmente a vontade de Deus exercita-se em todas as virtudes. Adoro e bendigo a santa vontade de Deus em todos os acontecimentos e circunstâncias da vida.
A santa vontade de Deus é o objeto do meu amor. (124) Nos mais ocultos recônditos da alma vivo a Sua vontade, e ajo exteriormente na medida em que reconheço interiormente que essa é a vontade de Deus. Agradam-me mais os tormentos, sofrimentos, perseguições e todo o tipo de adversidades provenientes da vontade de Deus do que sucessos, elogios e reconhecimentos provenientes do meu próprio querer.
679Boa noite, meu Jesus, a sineta me chama para dormir. Meu Jesus, vedes que agonizo de ansiedade pela salvação das almas. Boa noite, meu Esposo. Alegro-me que a eternidade já esteja um dia mais próxima, e, se permitirdes, Jesus, que acorde amanhã, começarei um novo hino em Vosso louvor.
680† 13 de julho. Hoje, durante a meditação, entendi que nunca devo falar sobre as minhas próprias vivências interiores; mas nada devo esconder diante do diretor espiritual. Pedirei a Deus, especialmente, luzes para o meu diretor (125) espiritual. Dou mais valor à palavra do confessor do que a todas as iluminações que recebo interiormente.
681† Nos mais pesados tormentos, fixo o olhar da minha alma em Jesus Crucificado; não espero ajuda dos homens, mas deposito a minha confiança em Deus; na sua insondável misericórdia está toda a minha esperança.
682† Quanto mais sinto que Deus me transforma, tanto mais desejo mergulhar no silêncio. O amor de Deus realiza a sua obra no fundo da minha alma; vejo que está começando a minha missão, aquela que o Senhor me confiou.
683† Quando, uma vez, rezava fervorosamente aos santos dos Jesuítas, de repente vi o anjo da guarda, que me conduzia ao trono de Deus. Eu passava (126) por grandes multidões de santos e reconheci muitos que já conhecia das imagens. Vi muitos Jesuítas que me perguntavam de que congregação eu era. Quando lhes respondi, perguntaram: “Quem é teu diretor espiritual?” Respondi que frei A... Quando quiseram falar mais, o meu anjo da guarda fez sinal de silêncio e eu passei diante do próprio trono de Deus. Vi uma claridade grande e inacessível. Vi o lugar que me estava destinado na proximidade de Deus, mas como ele era — não sei, porque estava encoberto por uma nuvem. Todavia, o meu anjo da guarda me disse: “Aqui está o teu trono pela fidelidade no cumprimento da vontade de Deus”.
684† Hora Santa. Quinta-feira. Nessa hora de oração, Jesus me permitiu entrar no Cenáculo e pude ver o que sucedia ali. Emocionei-me profundamente no momento em que Jesus, antes da consagração, ergueu (127) os olhos para o céu e entregou-Se a um misterioso diálogo com Seu Pai. Conheceremos devidamente esse momento apenas na eternidade. Seus olhos eram como duas chamas, o rosto radiante, branco como a neve, toda a postura majestosa, a Sua alma cheia de saudade. No momento da consagração, o amor descansou saciado — o sacrifício fora consumado na sua plenitude. Agora, apenas se cumprirá a cerimônia exterior da morte, a aniquilação exterior — a essência está no Cenáculo. Durante toda a minha vida, nunca tive um conhecimento tão profundo desse mistério como naquela hora de adoração. Oh, como desejo ardentemente que o mundo inteiro conheça este insondável mistério.
685Terminada a hora, quando me dirigi à cela, de repente senti o quanto Deus estava sendo ofendido por uma pessoa próxima ao meu coração. Vendo isso, a dor transpassou a minha alma e prostrei-me diante do Senhor, mendigando misericórdia. Por duas horas em lágrimas, oração e flagelação, (128) impedi o pecado e conheci que a misericórdia de Deus envolvera aquela pobre alma. Oh, quanto custa um único pecado!
686† Setembro. Primeira sexta-feira. À noite, vi a Mãe de Deus com o peito descoberto e transpassado por uma espada, derramando lágrimas amargas e nos defendendo do terrível castigo de Deus. Deus quer nos aplicar um terrível castigo, mas não pode, porque a Mãe de Deus nos defende. Um medo terrível atravessou a minha alma. Rezo sem cessar pela Polônia, pela minha querida Polônia, que é tão pouco grata à Mãe de Deus. Se não fosse Ela, de pouco serviriam os nossos esforços. Intensifiquei os meus esforços de orações e sacrifícios pela querida pátria, mas vejo que sou uma gota diante da onda do mal. Como uma gota pode deter uma onda? Oh, sim! Por si só uma gota nada é, mas Convosco, Jesus, enfrentarei corajosamente toda a onda do mal e até (129) o inferno inteiro, pois Vossa onipotência tudo pode.
687Quando, uma vez, eu estava passando do corredor para a cozinha, ouvi na alma estas palavras: Recita, sem cessar, esse Terço que te ensinei. Todo aquele que o recitar alcançará grande misericórdia na hora da sua morte. Os sacerdotes o recomendarão aos pecadores como a última tábua de salvação. Ainda que o pecador seja o mais empedernido, se recitar esse Terço uma só vez, alcançará a graça da Minha infinita misericórdia. Desejo que o mundo todo conheça a Minha misericórdia. Desejo conceder graças inconcebíveis às almas que confiam na Minha misericórdia.
688Jesus, Vida e Verdade, meu Mestre, guiai cada passo da minha vida, para que eu proceda de acordo com a Vossa santa vontade.
689(130) † Em certa ocasião, vi o trono do Cordeiro de Deus e diante do trono, três santos: Estanislau Kostka, André Bobola e o príncipe Casimiro, que intercediam pela Polônia. Logo em seguida, vi um grande livro, que estava diante do trono, e foi-me dado o livro, para que eu o lesse. Esse livro estava escrito a sangue; contudo, nada consegui ler, a não ser o Nome de Jesus. Então, ouvi uma voz que me disse: Ainda não chegou a tua hora. — O livro foi-me tirado e escutei estas palavras: Tu darás testemunho da Minha infinita misericórdia. Neste livro estão inscritas a almas que glorificaram a Minha misericórdia. A alegria me envolveu, vendo a tão grande bondade de Deus.
690† Em determinado momento, conheci o estado de duas religiosas que murmuravam interiormente contra uma ordem dada pela superiora. Em consequência disso, Deus lhes reteve muitas graças especiais. (131) A dor me apertou o coração quando vi isso. Como é triste, Jesus, se nós mesmas somos a causa da perda das graças. Quem compreende isso é sempre fiel.
691† Quinta-feira. Hoje, embora estivesse muito cansada, resolvi fazer a Hora Santa. Mas não conseguia rezar, nem ficar de joelhos; no entanto, permaneci em oração a hora toda e unia-me, em espírito, com aquelas almas que já glorificam a Deus de maneira perfeita. Ao final da hora, de repente vi Jesus, que olhou para mim profundamente e, com indizível doçura, disse: A tua oração Me é imensamente agradável. Depois dessas palavras entrou na minha alma uma estranha força e uma alegria espiritual. A presença de Deus impregnou toda a minha alma. Oh, o que acontece com a alma que se encontra face a face com o Senhor! Nenhuma caneta conseguiu expressá-lo, nem expressará jamais.
692 (132) † Ó Jesus, compreendo que a Vossa misericórdia é inexprimível. Por isso Vos suplico: tornai o meu coração tão grande que possa conter as necessidades de todas as almas que vivem na face da terra. Ó Jesus, o meu amor vai além do mundo, estende-se até às almas que sofrem no purgatório; também por elas quero praticar misericórdia através de orações que possuem indulgências. A misericórdia de Deus é sempre insondável e inesgotável, como é insondável o próprio Deus. Ainda que eu me valesse das palavras mais veementes para expressar essa misericórdia de Deus, tudo isso nada seria em comparação com o que ela é na realidade. Ó Jesus, fazei o meu coração sensível a cada sofrimento do meu próximo, seja da alma ou do corpo. Ó meu Jesus, sei que Vós procedeis conosco como nós procedemos com o próximo.
Meu Jesus, fazei o meu coração semelhante ao Vosso misericordioso Coração. Jesus, ajudai-me a passar pela vida fazendo o bem a todos...
693 (133) 14 de setembro [de 1936]. Veio visitar-nos o arcebispo de Vilnius[327]. Embora tivesse demorado tão pouco tempo, tive a possibilidade de conversar com esse distinto sacerdote sobre a obra da misericórdia. Mostrou-se muito favoravelmente inclinado para com esta causa: “A irmã fique inteiramente tranquila. Se isso estiver nos desígnios da providência de Deus, será realizado. Por agora, a irmã reze, pedindo um sinal exterior mais claro. Que Nosso Senhor permita à irmã conhecer melhor esse assunto. Queira esperar mais um pouco. Nosso Senhor encaminhará de tal forma as circunstâncias que tudo ficará bem”.
69419 de setembro [de 1936]. Quando saímos do médico[328] e entramos por um momento na capela que existe nesse sanatório[329], ouvi estas palavras na alma: Minha filha, restam só mais algumas gotas no teu cálice, e já não vai demorar muito. A alegria (134) encheu-me a alma, eis o primeiro chamado do meu Esposo e Mestre. Enterneceu-se o meu coração e houve um momento em que a minha alma mergulhou por inteiro no mar da misericórdia de Deus. Senti que estava começando, em toda a sua plenitude, a minha missão. A morte não destrói nada que é bom. Rezo sobretudo pelas almas que passam por sofrimentos interiores.
695Em certa ocasião recebi uma iluminação a respeito de duas irmãs. Compreendi que não se pode proceder da mesma forma com todos. Existem pessoas que têm a estranha capacidade de cativar a nossa amizade e, depois, a pretexto de nos ajudar como amigas, extraem de nós uma palavra depois da outra, e logo, na primeira oportunidade, usam essas mesmas palavras para nos trazer dissabores. Meu Jesus, como é estranha a fraqueza humana. Só o Vosso amor, Jesus, é que dá à alma essa grande prudência no trato com os outros.
696 (135) † 24 de setembro de 1936.
A madre superiora[330] recomendou que eu rezasse uma dezena do Rosário no lugar de todos os exercícios e logo fosse para a cama. Assim que me deitei, logo adormeci, porque estava muito cansada. Depois de um instante, porém, o sofrimento me acordou. Era um sofrimento tão grande que não me permitia fazer o menor movimento, e eu nem mesmo podia engolir a saliva. Isso durou umas três horas. Pensei em acordar a irmã noviça[331] que comigo partilha a cela, mas pensei: “Afinal, ela não me poderá dar ajuda alguma, então que durma; seria uma pena acordá-la”.
Entreguei-me inteiramente à vontade de Deus e pensei que já tinha chegado aquele tão desejado dia da minha morte. Tive a possibilidade de me unir com Jesus, sofrendo na cruz; de outra forma não podia rezar. Quando passou o sofrimento, comecei (136) a suar, mas não podia fazer qualquer movimento, porque logo voltava ao estado anterior. De manhã sentia-me muito cansada, mas já não sofria fisicamente; todavia, não pude levantar-me para a santa Missa. Pensei que, se após tais sofrimentos não ocorria a morte, quão grandes deviam ser os sofrimentos da morte.
697Jesus, Vós sabeis que amo o sofrimento e desejo esgotar o cálice dos sofrimentos até a última gota e, no entanto, a minha natureza sentiu um leve tremor e medo — mas logo a minha confiança na infinita misericórdia de Deus despertou com toda a sua força, e tudo teve que ceder a ela, como a sombra ao raio do sol. Ó Jesus, como é grande a Vossa bondade! Essa Vossa infinita bondade, que eu bem conheço, permite-me enfrentar corajosamente a própria morte. Tenho certeza de que nada me acontecerá sem a Vossa permissão. Desejo glorificar a Vossa infinita misericórdia na vida, na hora da morte, na ressurreição e por toda a eternidade.
(137) † Meu Jesus, minha força, minha paz e meu descanso, nos Vossos raios de misericórdia mergulha a minha alma todos os dias, não há um só momento na minha vida em que não experimente a Vossa misericórdia, ó Deus. Com nada mais conto em toda a minha vida senão com a Vossa infinita misericórdia, Senhor — ela é a estrela que me conduz na minha vida. Minha alma está repleta da Misericórdia de Deus.
698† Oh, como a ingratidão da alma eleita fere a Jesus! Seu inconcebível amor sofre um martírio. Deus nos ama com todo o Seu Ser infinito, que Ele é, e eis que um mísero grão de pó despreza esse amor. O meu coração dilacera-se de dor ao conhecer essa ingratidão.
699Em determinado momento ouvi estas palavras: Minha filha, fala a todo o mundo da Minha inconcebível (67) misericórdia. Desejo que a Festa da Misericórdia[332] seja refúgio e abrigo para todas as almas, especialmente para os pecadores. Nesse dia estão abertas as entranhas da Minha misericórdia. Derramo todo um mar de graças sobre as almas que se aproximam da fonte da Minha misericórdia. A alma que se confessar e comungar alcançará o perdão das culpas e das penas. Nesse dia estão abertas todas as comportas divinas, pelas quais fluem as graças. Que nenhuma alma tenha medo de se aproximar de Mim, ainda que seus pecados sejam como o escarlate. A Minha misericórdia é tão grande que, por toda a eternidade, nenhuma mente, nem humana nem angélica, a aprofundará. Tudo o que existe saiu das entranhas da Minha misericórdia. Toda alma contemplará em relação a Mim, por toda a eternidade, todo o Meu amor e a Minha misericórdia. A Festa da Misericórdia saiu das Minhas (139) entranhas. Desejo que seja celebrada solenemente no primeiro domingo depois da Páscoa. A humanidade não terá paz enquanto não se voltar à fonte da Minha misericórdia.
700† Uma vez em que eu estava muito cansada e sofrendo, ao contar tal coisa à madre superiora, recebi a resposta de que eu devia me habituar a viver com o sofrimento. Ouvi tudo o que a madre me disse e saí em seguida. A nossa madre superiora tem tanto amor ao próximo, especialmente às irmãs doentes, que todos a conhecem por isso. No entanto, quanto a mim, Nosso Senhor permitia estranhamente que ela não me compreendesse e me submetesse a tantas provações nesse aspecto.